Olá Gizcasters, tudo bem com vocês? Espero que sim!

Bom, passamos um tempo sem fazer posts (eu, Caio ainda mais) por questões ligadas a faculdade. Neste último (2016) ano aprendi que há um grande espaço entre a vontade de desenvolver vários projetos e a capacidade de tocá-los; mas, enfim, nosso foco aqui não é este.

Hoje, neste O Longa das Aulas, farei uma apresentação sobre o Filme Rocky IV, trazendo algumas interpretações a respeito das intenções e valores por de trás deste longa metragem. É importante deixar claro, logo de início, que estas não são as ÚNICAS leituras possíveis, nem tão pouco são exclusivamente minhas (abraço pro Dantas, meu colega de faculdade) ; nosso intuito (meu e do Gabriel) com esta área do blog é, justamente, a abertura de um espaço para o fomento a diferentes reflexões sobre filmes, a fim de expandir suas problematizações em sala de aula. Dito isso, vamos ao que interessa.

Rocky IV

Título: Rocky IV
Ano de lançamento: 1985
País de Origem: Estados Unidos
Gênero: Drama
Duração: 91 minutos.
Direção: Sylvester Stallone
Elenco Principal: Sylvester StalloneTalia ShireBurt YoungCarl WeathersDolph Lundgren.

ATENÇÃO: O TEXTO CONTÉM SPOILERS!

O primeiro aspecto interessante sobre esta franquia é que, apesar de haver uma sequência, não há necessidade de assistir os filmes na ordem de seu lançamento. Esta característica é importante porque, já que pretendemos uma abordagem em sala de aula, não se torna necessário fazer uma introdução longa sobre o “universo” do filme ou passar algum trecho de filmes anteriores; é claro que alguns detalhes são perdidos ao não ter conhecimento dos outros, mas eu não julgo que isto afete o entendimento do eixo crucial da trama, aliás, este é o primeiro elogio/destaque que eu faço.

As cenas iniciais do filme cumprem muito bem com a função de nos familiarizar com os personagens. Seja no diálogo do Rocky com Apollo (logo na abertura), seja no diálogo de Rocky com seu filho enquanto este o filma ao chegar em casa, mas, principalmente, na cena em que ele chega de roupão, trazendo um bolo para sua mulher, que está na cama, lembrando do aniversário de 9 anos de casamento. Sim: além de um boxeador de sucesso – a mansão e os carros dele atestam isso – e um pai interessado, Rocky é, acima de tudo, um marido atencioso (isso é ressaltado inúmeras vezes, não só neste como noturos filmes). Fica claro, portanto, que o filme nos quer apresentar aquela “família americana modelo” em que os componentes não são só felizes e realizados, mas também bem sucedidos.

(Guarde o robô, a filmadora e os carros na manga, usarei eles depois)

Guerra Fria

Vamos iniciar nosso texto pulando a apresentação do Drago e toda a atmosfera “pesada” que paira sobre ele e a coletiva de imprensa que termina no maior estilo das “encaradas” atuais de UFC. Todos os diálogos deixam claríssimo a rivalidade entre os EUA e URSS que existiu durante a Guerra Fria. Rivalidade esta testada no esporte, principalmente – daí vem o nome do período, inclusive: se ambas as potências não chegaram a se enfrentar diretamente pela via bélica, os confrontos esportivos, sobretudo olímpicos, eram extremamente aguardados e exaltados. Para aqueles alunos que têm mais dificuldade com História e mesmo de interpretação (pelos mais variados motivos), vale a pena passar pausadamente, até repetir se for o caso, a fala de Apollo em seu vestiário momentos antes de luta:

Ao ser indagado por Rocky se a luta não seria “só mais uma exibição”, Apollo se indigna e lança a seguinte fala:

Não, não… É aí, por isso que você está errado. Está não e somente uma luta de exibição, que não significa nada! Isto é nós contra eles! Garanhão [apelido do Rocky], talvez você não saiba sobre o que eu estou falando agora, mas saberá quando acabar.

Esta fala é fantástica e reveladora. Se havia sobrado alguma dúvida sobre do que o filme está tratando, esta fala traz tudo a tona. O mais interessante é a noção, muito comum na época, de “nós contra eles”, de algo muito maior do que os dois personagens. Era um clima que pairava sobre todos à época, a sensação de uma “guerra iminente”/”tensão” enorme que não encontrava um desfecho. Isto foi a Guerra Fria.

O Gatilho

Bom, chegamos então ao gatilho para o drama do filme: durante a luta do Drago contra o Apollo, o americano é morto. Rocky, que poderia ter jogado a toalha  branca (declarando desistência), mesmo a contra gosto de seu melhor amigo, não o fez. Este é o momento de “virada” (turning point) da história. O clima alegre desaparece e surge a dor: uma dor centrada principalmente no protagonista, que puxa pra si toda a culpa do que aconteceu.

A “vingança” de Rocky é marcada na Rússia, no dia do Natal, por ele mesmo.  É possível pensar no simbolismo ao redor da data, não só sob prisma do nascimento de Jesus e isso representando um paralelo com a “superação” do luto que Rocky sofre, como também o fato de ser o principal feriado para o mundo Ocidental, sendo uma das datas mais importantes para o capitalismo. Mas deixarei isso no ar por motivos de um possível excesso de empolgação.

O Treinamento

Tentando enxugar ao máximo o texto sem perder seu conteúdo, pularei para a cena do treinamento. Sem dúvida, um dos grandes momentos do filme. Quase 8 minutos inteiramente dedicados a demonstrar o esforço dos 2 personagens principais em se preparar para o embate principal da trama. Toda a evolução das cenas, cortando ora para o esforço ora do Rocky ora do Drago, aliado à música, evidencia que este é o grande clímax. Mas vamos a interpretação.

Este é um retorno do nosso herói às suas origens, é o treinamento “cru”, à céu aberto, enfrentando os percalços da neve e do lugar estranho para ele, improvisando suas ferramentas de treino, focado em seu grande objetivo. Enquanto Drago, o anfitrião, se fecha em um ginásio, com altíssima tecnologia, medindo e buscando o máximo de seu rendimento em conjunto com computadores e ferramentas muito implementadas.

Lembram-se do robô, os carros e a câmera? Pois bem, junte eles à cena (não discutida por mim) em que Apollo adentra ao ring.  O que temos? Tecnologia, é claro, mas com usos completamente diferentes… A tecnologia dos Estados Unidos parece servir aos seres humanos de forma “alegre”. Ela nos traz conforto, explora nossas emoções com shows (a presença do James Brown reforça essa ideia); o que se vê na Rússia, por outro lado, nos assusta.

Uma tecnologia que parece se misturar ao ser humano, quase que anulando-o; todas as feições, as frases curtas e pausadas, as poses de Drago: tudo nos leva a crer de que ele foi programado e não sente emoções. Tudo isso sob o discurso de evolução e futuro, o qual o treinador do Drago evoca diversas vezes ao longo do filme. Por fim, é claro, não poderia passar em branco: aparece a trapaça, Drago faz uso de anabolizantes, algo extremamente mal visto no mundo esportivo.

Os Rings

O último ponto que destaco nesta análise se constitui numa comparação entre os rings dos Norte americano X Soviético. Se nos EUA a luta foi em Las Vegas – um dos grandes símbolos do universo do jogo e da fantasia – contendo um jogo de cores e luzes e com um show musical (como mencionado no parágrafo anterior), pessoas felizes, gritando e se expressando. O que se vê na Rússia soviética é o oposto. A começar pela aparição de “grandes figuras” da esquerda (Marx, Lênin).

Seguido pela massiva presença de militares, TODOS os cortes contém indivíduos fardados (mesmo quando é filmado os narradores americanos é possível ver soldados passando atrás), com semblante sério. Passando pelo monocromatismo das roupas dos espectadores da luta e a quase ausência de luz, que dificulta a identificação dos rostos de líderes do politburo. Tudo culminando com o momento solene em que a bandeira soviética com o rosto de Drago é hasteada e a população toda, de pé, canta com respeito. Stallone não nos deixa com dúvidas, estamos falando de uma ditadura e do controle da liberdade.

Finalmente, julgo que este trecho final é bacana para explorar os inúmeros estereótipos que se têm, sobretudo, do que foi o regime soviético. Pensando no que ele consistiu de fato e o que foi imagem criada pela propaganda.

Conclusão

Para acabar, este filme é, no limite, isto: uma propaganda. E abordar os inúmeros detalhes que compõem, desde a criação dos personagens até os cenários em que o longa se passa, e mesmo a relação entre os dois elementos recém-apontados, são uma boa forma de aprofundar no ensino do período, abordando na própria memória que se construiu sobre a Guerra Fria e o regime soviético. Enfim, espero que tenham gostado e até a próxima!