Aqui não é Ratinho! Convocamos nossa tripulação para uma resenha sobre a proposta do Paulo Guedes de ~reforma~ da previdência brasileira.
Desde o começo, o Governo Bolsonaro tem anunciado severos cortes de direitos na previdência como se fosse a salvação da economia brasileira. Desta forma o governo tenta responder às sucessivas previsões de institutos de pesquisa de queda no crescimento. A proposta prevê aumento na idade mínima e no tempo de contribuição, o fim de aposentadorias especiais para algumas carreiras como a docente, além da desconstitucionalização da previdência, o que facilitaria futuras alterações.
O que é ainda mais grave, a proposta também prevê o fim do regime de solidariedade da previdência, transformando-a num regime de capitalização individual dos trabalhadores. Em outras palavras, o que o trabalhador conseguir guardar ao longo de sua vida laboral é o que ele terá para a aposentadoria, sem nenhuma garantia de direitos mínimos.
O que está por trás deste projeto? O déficit da previdência é real mesmo? E os tais devedores do INSS? Como será a tramitação da reforma no Congresso? E a luta popular para barrar mais este ataque?
Para tratar destas e outras questões do direito à aposentadoria em nosso país, nosso imediato Marcelo Pereira chamou a bordo do iate Juliane Furno, do Levante Popular da Juventude, e Márcio Morais, do podcast É Pau É Pedra. Também recebemos a mais nova integrante da nossa tripulação fixa, Jordânia Souza.
Além disso contamos com a participação especial de um chegado nosso do INSS (que não pode revelar sua identidade). Ele conta para nós da previdência dos servidores públicos dos municípios. Por fim, o professor Fábio Garrido, do SINDUTE, explica para gente como a reforma da previdência ataca particularmente a categoria docente.
Ficha técnica
Roteiro e Edição: Marcelo Pereira. Logo do Granma: Tiago de Macedo Rodrigues. Capa: Marcelo Pereira. Participação especial: Fábio Garrido.
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Referência ABNT deste episódio
GRANMA #022: Resenha – Previdência. Locutor: Marcelo Pereira. Participantes: Juliane Furno, Márcio Morais e Jordânia Souza. 24 de junho de 2019. Podcast. Disponível em: http://www.granma.com.br/2019/06/24/resenha-previdencia/ Acesso em: data de acesso.
Texto integral do nosso correspondente no INSS
Olá, ouvintes do Granma! Com muito prazer escrevo este texto a pedido do amigo Marcelo. Escrevo e não assino porque, infelizmente, o INSS publicou o Ofício Circular nº 4 PRES/INSS em 08 de março. Essa normativa determina: “ficam desautorizados a concessão de entrevistas e o fornecimento de informações sobre o tema no âmbito deste Instituto”, ou seja, expulsou os servidores do INSS- classe à qual pertenço há mais de dez anos – da discussão sobre a reforma da Previdência. Tristes tempos em que o debate público é soterrado pela desinformação.
De todo o modo, eis-me aqui para apresentar uma faceta da Seguridade Social, tema que consegue ser complicado por todas as variáveis envolvidas e ao mesmo tempo tão delicado, visto que nos afeta diretamente. Vim falar um pouco sobre Regimes Próprios de Previdência Social.
Contextualizando, o sistema de previdência brasileiro pode ser dividido em dois grandes grupos: um conhecido por Regime Geral de Previdência Social – RGPS – que é operacionalizado pelo INSS e engloba os trabalhadores de carteira assinada, contribuintes em carnê, produtores rurais e servidores públicos ocupantes de cargos de livre nomeação e exoneração. Já o segundo é composto por Regimes Próprios de Previdência Social que são destinados aos servidores públicos efetivos, aqueles aprovados em concurso público.
Para ficar mais fácil entender, olhemos ao nosso redor. Aqui em Belo Horizonte nós temos o servidor municipal vinculado ao seu regime próprio, o Marcelo que está ligado ao regime dos servidores federais, o professor do Estadual Central que se filia ao IPSEMG, o Juiz do Fórum Lafayette ao dos magistrados estaduais… é, não ficou mais fácil.
Isso porque a Constituição da República permitiu em seu artigo 40 que cada Município e Estado criasse um regime de previdência, bastando, para tanto, que garantisse aos seus participantes os benefícios mínimos de aposentadoria e pensão.
Mas isso foi bem recente, foi só no ano de 2003 que a Emenda Constitucional nº 41 disciplinou melhor a situação previdenciária do servidor público, até então tínhamos Regimes próprios, é verdade, mas de forma bem mais bagunçada. Não havia normas que garantissem quem poderia se filiar, nem quais benefícios lhe seriam concedidos, muito menos condições mínimas como tempo de contribuição e valores a serem recolhidos e pagos. A única regra é que para se considerar Regime de Previdência o mínimo de aposentadoria e pensão tinham que ser garantidos.
Se pegarmos só a situação do Estado de Minas Gerais, o caos fica mais visível. As Prefeituras podiam firmar convênios com o IPSEMG com o conteúdo que sua legislação determinasse. E daí não havia limites à criatividade das Câmaras Municipais.
Podia envolver só a assistência à saúde – os trabalhadores municipais seriam atendidos pelo Hospital do IPSEMG, por exemplo, mas vinculados integralmente à previdência municipal. Ou abarcar o pagamento de aposentadoria pelo Estado e Pensão pelos cofres da Prefeitura. Ou o inverso, o Município aposentar e Minas Gerais arcar com a pensão, tantas possibilidades e tantas situações quantas nossas mais de 800 cidades permitirem.
Usei as palavras caos e bagunça propositadamente. Sabem por quê? Porque uma hora a conta chegou. Os servidores envelheceram e passaram a buscar seu merecido descanso por meio da aposentadoria. A Lei de Responsabilidade Fiscal instituiu regras rígidas para o equilíbrio orçamentário e, convenhamos, a Administração da coisa púbica se profissionalizou.
O cenário era mais ou menos o seguinte: O Estado de Minas precisava alcançar as Certidões de regularidade fiscal para obter empréstimos e verbas federais, assim passou a controlar melhor seu gasto com pessoal. Para tanto, revisou todos os convênios, dispensando os servidores que não eram seus.
As Prefeituras, a maior parte dependendo do Fundo de Participação dos Municípios para sobreviver, tinham que encontrar uma solução. Algumas criaram seus Regimes Municipais que, a duras penas, conseguem ir pagando seus inativos.
Mas o grosso migrou para o Regime Geral de Previdência Social – o INSS. Mas essa migração não resolveu todo o imbróglio. O INSS exige documentos que nem sempre o Estado e o Município entregam, a chamada CTC, ou Certidão de Tempo de Contribuição. Acaba que boa parte dos trabalhadores se veem em um limbo previdenciário, restando ao Judiciário definir a solução. Ou seja, a Justiça determina que se aposente o cidadão, mas nem sempre mediante a contribuição previdenciária como contrapartida.
O que eu quis mostrar nesse breve texto é que a questão previdenciária é complexa, com diversas variáveis muitas das vezes ignoradas pelos políticos, mas que sempre resvalam no INSS aumentando o que se convencionou chamar de déficit previdenciário. Encerro trazendo uma curiosidade: o texto da Reforma Previdenciária que tramita no Congresso exclui os servidores estaduais e municipais. Tão somente porque os deputados federais não querem arcar com esse desgaste, deixando às assembleias dos Estados e às Câmaras de Vereadores o ônus de lidar com essa impopularidade.
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