Entre as informações e a guerra, as carteiras
Fala pessoal do Desaprender tudo bem com vocês? Eu espero que sim!!
Há pouco mais de 5 anos, quando o projeto Desaprender ainda engatinhava, eu escrevi um texto com algumas observações sobre a guerra fria em meio à trama do filme Rocky IV. O tempo passou, eu adquiri mais experiência em sala de aula; passei a lecionar Sociologia e Filosofia, além é claro da componente de História (minha formação de origem) e…cá estamos nós: meio atônitos, meio perdidos, em meio à um conflito entre Rússia e Ucrânia, com umas pitadas de interferência da OTAN, a ONU se pronunciando, as grandes mídias fazendo a cobertura de tudo; e há essa necessidade, impostas por nós mesmos ou pelos outros, de bater o martelo dizendo “eu estou/sou ao (o) lado de fulano/beltrano”.
Bom, o intuito deste texto não é construir uma análise a respeito da geopolítica da região dos Bálcãs. Tão pouco fazer uma recapitulação histórica do fim da União Soviética e o expansionismo da OTAN. Isso porque eu tenho consciência da minha falta de tamanho e estofo acadêmico para “meter a colher” nesse debate. E, na linha do que costumavam dizer alguns velhos parentes (e muitos de vocês já devem ter ouvido) “muito ajuda quem não atrapalha.”
Então, Caio, por que você está escrevendo? Porque, se teve uma coisa a pandemia e o Brasil do Bolsonaro ensinou foi: a grande contribuição que todo cidadão engajado nos debates e questões públicas pode dar é atuar como um polo de reverberação das informações mais confiáveis/seguras/verificadas, produzidas principalmente por aqueles que tem conhecimento REAL sobre o assunto. E, portanto, se o meu conhecimento está dentro da sala de aula, e o que ela concerne, é partindo deste espaço que vou compartilhar as ideias e impressões nas linhas abaixo.
Polêmica da vez
Quem é professor(a) sabe que, quando se trata de um tema polêmico ou que está ocupando bastante espaço na mídia, teremos ao menos três tipos de alunos: os que chegarão reproduzindo a opinião dos pais; os que vão imitar a linguagem do influencer/rede social que ele(a) tem maior contato; e os que genuinamente não tem ideia do que pensar. (Para fins de “cálculo” vamos excluir aqueles que tão nem aí pro papo – apenas pelo fato de não querer alongar muito este texto. Mas esses alunos(as) sempre são importantes, dentro ou fora da sala de aula).
O que eu tenho optado por fazer, e tive que fazê-lo ao menos seis vezes esse ano, em turmas diferentes, inclusive, é começar a conversa dando uma breve contextualizada no que está acontecendo (ao final do texto, colocarei links de eps de podcasts e @s do twitter que eu tenho seguido para me informar). O que é “breve”? Prof. de história é f#%a porque qualquer coisa a gente já quer voltar pro império bizantino ou uns 3 séculos antes do tema, então eu não creio que haja “receita de bolo”.
Logo, eu opto por tocar em 3 pilares: existe um laço histórico muito forte entre os povos, russo e o ucraniano; a Ucrânia é um Estado-Nação (pode falar país) muito novo; e a OTAN e a Rússia não se bicam. Feito isso, eu comento sobre como a ação do Putin foi surpreendente ao decidir atacar e invadir a Ucrânia INTEIRA (se você já sabia/esperava, parabéns, troféu pra ti).
Propaganda
Passada essas duas partes, chego ao que julgo ser o ponto crucial a abordarmos em sala hoje. Essa é uma guerra do século XXI, lutada com armas do século XXI – todas aquelas que imaginamos, mas, principalmente, as que não imaginamos. E, aquela que os (as) estudantes menos tem noção de como funciona é a propaganda. Aqui tomo a liberdade de inserir Fake News e desinformação na categoria “propaganda” porque, neste caso, entendo que ambas são produzidas para ter o “mesmo efeito”: fidelizar e cativar seu espectador. Então, o que eu luto para deixar bastante claro para a classe é que, se antigamente, durante a segunda guerra mundial por exemplo, a produção e disseminação de informações falsas demoravam mais; hoje, com Instagram/Twitter/Reddit, em segundos, as coisas atingem o mundo todo. É essa a tão falada “guerra de narrativas” que vemos muita gente falando.
O problema é que, se a imagem e o vídeo se tornaram mais comuns e comovem muito mais, a formação de opinião também acaba sendo quase “instantânea”. E aí, como ponderar sobre as alegações russas e suas razões frente a crianças e mães chorando nos check points de zonas fronteiriças? Como manter a calma para procurar alguma justificativa razoável ao ouvir que “os russos estão ‘bombardeando’ regiões próximas a usinas nucleares”. Ainda mais, enquanto na tela são projetadas imagens de helicópteros voando, raios de luz no meio da noite e explosões?
Desconfie
O ponto, aqui, não é escolher ou defender um dos lados, até porque existe muito mais que dois neste conflito; e sendo sincero, eu sinto que qualquer do partido que se escolha tomar, por mais coerente que possa parecer, implicará em desconsiderar posições outras de igual relevância. Logo, a conclusão que defendo em sala segue na linha de lutarmos contra a pressa em firmar uma posição. E, sobretudo, desconfiarmos sempre do que recebemos ou encontramos. Quem me mandou? Por que me mandou? O que essa informação que eu recebi procura causar em mim? Ela foi checada, ou seja, aconteceu de fato?
Imagem da capa: https://www.tc.columbia.edu/