A falta de interação face a face está formando uma geração de crianças e adolescentes incapazes de identificar sentimentos?
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Quando você e eu éramos crianças, o mundo ainda não tinha sido dominado pela internet. Nossa conexão com a tela se limitava à TV (na sala de casa) e alguns momentos de videogame que eram interrompidos por noticiários e novelas. Por isso a maior parte das brincadeiras era offline mesmo, jogando jogos de tabuleiro em tardes chuvosas, brincando de detetive, amarelinha e tantas outras coisas. Quando tínhamos trabalho de escola, era mais comum irmos a casa dos colegas. Mas vinte ou trinta anos fazem muita diferença, o mundo mudou.
A internet deixou de ser exclusividade dos microcomputadores e tornou-se uma extensão de nosso pensamento em celulares, relógios, carros e até geladeiras. A interação entre indivíduos distantes no espaço é imediata e constante. Aliado a esse fato, com o aumento da violência nas ruas, é mais comum que crianças e adolescentes fiquem em casa, em videogames, canais de youtube, redes sociais e telas de celular. A redução da interação face a face pode trazer algum impacto para o futuro de crianças e adolescentes dessa geração?
A convivência com outras pessoas transforma nossas expressões corporais
Há algum tempo atrás, Robert Zanoc, professor na universidade de Michigan, nos Estados Unidos, desenvolveu um estudo comparando as expressões faciais de casais recém casados e casais com mais de 25 anos juntos. A conclusão foi que o maior tempo de convivência leva a uma semelhança das expressões, em outras palavras, nós tendemos a imitar aquelas pessoas com quem convivemos.
Se lemos e reproduzimos as expressões das pessoas com as quais convivemos, uma hipótese imediata é que a convivência face a face é fundamental não só para aprendermos a entender as expressões de outras pessoas, como também para aprendermos a mover os músculos certos para transmitirmos os nossos sentimentos em nossos rostos.
Crianças que têm mais interações presenciais identificam melhor os sentimentos dos outros
Em 2012, cinquenta e uma crianças de escolas americanas visitaram um acampamento de verão, um daqueles típicos de filmes infantis americanos. A maior parte dessas crianças possuía celulares e que utilizavam com frequência, mas foram obrigados a deixar os aparelhos de lado antes de iniciarem as atividades que incluíam caminhadas, jogos de desafio, esportes e outras atividades coletivas. Ou seja, durante um período de uma semana, essas cinquenta e uma crianças ficaram em uma imersão de atividades presenciais, afastadas de qualquer tela (celular, computador e mesmo TV).
No início da semana, antes de serem afastados de seus celulares, os alunos foram submetidos a um teste de percepção de sentimentos expressos por adultos e crianças que eram apresentadas em imagens estáticas ou arquivos sonoros. Neste primeiro teste, em média, as crianças erraram 14 das 48 expressões apresentadas.
Depois da semana de atividades coletivas, convivendo com outras crianças de idades próximas e também com os monitores do acampamento, sem que tivessem acesso aos resultados do primeiro teste, as mesmas crianças foram novamente avaliadas e a taxa de erro caiu para 9,5 em média. A melhora do desempenho desse grupo foi 50% maior do que a obtida pelo grupo de controle, que era composto por crianças com perfil semelhante que não foram ao acampamento e mantiveram o contato com telas.
Crianças precisam de interação para o seu desenvolvimento
Sem ver a pessoa com quem interagimos, parece ser uma conclusão lógica de que perderemos a capacidade de interpretar suas expressões faciais e corporais. Mesmo quando interagimos através de vídeo, há um número limitado de informações que somos capazes de perceber no enquadramento escolhido pelo emissor. Assim, se você deseja que sua criança seja capaz de compreender o outro e também se expressar facial, vocal e corporalmente, ela precisa de ter contato presencial com outros adultos e crianças, especialmente nas chamadas fases críticas do desenvolvimento, dos 0 aos 5 anos e dos 10 aos 15 (está aí uma das grandes importâncias do Ensino Fundamental de maneira presencial).
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